quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Cientistas reconstituem face de rei francês 400 anos depois

Henrique IV ficou conhecido na história por ter promulgado o Edito de Nantes, que permitia liberdade de culto aos protestantes

por Redação Galileu

Editora Globo
Philippe Foesch, especialista em crânios da Universidade de Barcelona, reconstruiu a face do rei com auxílio de um gerador 3D a partir de 700 fotos em preto e branco do crânio / Créditos: AFP
A imagem acima, gerada por computador pela Visual Forensic, revela a reconstituição da cabeça do rei da França Henrique IV. O soberano morreu aproximadamente aos 57 anos, quando foi assassinado por um católico fundamentalista, em 14 de maio de 1610.
 
Há três anos, alguns elementos-chave deram indícios de que um crânio desenterrado pudesesse pertencer ao soberano francês, como a orelha furada e um corte próximo à região do nariz. Assim, foram feitos testes genéticos entre essa cabeça mumificada e o sangue seco de Luís XVI, descendente de Henrique IV, para verificar a compatibilidade. Com isso, criou-se um painel em que cientistas forenses, liderados por Philippe Charlier, identificaram um perfil genético semelhante e assim, determinaram que o crânio pertencia ao rei.
Editora GloboRecentemente, foi processada uma imagem que mostra o aspecto do rosto de Henrique IV com mais detalhes. Embora com quase 57 anos, a imagem do rei traz um aspecto bastante envelhecido, devido às condições de higiene bastante precárias da época.

Philippe Foesch, especialista em crânios da Universidade de Barcelona, reconstruiu a face do rei com auxílio de um gerador 3D a partir de 700 fotos em preto e branco do crânio. O tamanho do nariz, segundo o especialista, foi calculado utilizando-se as mesmas técnicas da unidade de combate ao terrorismo do FBI.

Henrique IV ficou conhecido na história por ter promulgado o Edito de Nantes, que permitia liberdade de culto aos protestantes. Ao morrer, foi sepultado como outros reis na Basílica de Saint Denis. Em 1973, alguns revolucionários da França desenterraram seu corpo e um deles acabou fugindo com sua cabeça.
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Há três anos, alguns elementos-chave deram indícios de que um crânio desenterrado pudesesse pertencer ao soberano francês, como a orelha furada e um corte próximo à região do nariz / Créditos: AFP
 

Entenda o que significa a exumação do corpo de Dom Pedro I e suas mulheres

A História do Brasil está sendo exumada. O corpo de Dom Pedro I e das duas mulheres que ele teve durante a vida foram retirados da cripta em que estavam para serem submetidos à uma análise tão meticulosa quanto à tecnologia atual permite. Esse é um daqueles raros momentos que obrigam os próximos livros de História a serem revistos e reeditados.
Mas o que foi descoberto de tão novo? Bastante coisa. O que mais chamou atenção dos pesquisadores foi o fato de haver uma múmia entre os cadáveres. Dona Amélia, segunda mulher de Dom Pedro, foi mumificada antes de ser enterrada – fato que não consta em nenhum registro histórico até então. Unhas, globos oculares, cabelos, cílios… tudo está ali, tudo tão bem conservado que ela já é apontada como uma das múmias bem preservadas do Brasil. Até o seu útero resistiu ao tempo. Os historiadores creditam a excelente preservação a um pequeno corte na jugular da imperatriz: foi através dele que aromáticos como cânfora e mirra foram despejados, retardando a decomposição. A urna em que ela foi sepultada foi lacrada de maneira tão hermética que os microrganismos simplesmente não foram capazes de deteriorar sua carne.
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O trabalho, sem precedentes no Brasil, é fruto da obstinação de uma mulher: Valdirene do Carmo Ambiel convenceu os descendentes do imperador a liberarem a exumação em 2010 e desde então vem estudando os corpos no local onde eles estavam enterrados, uma cripta no Parque da Independência, na zona sul de São Paulo. Na apresentação da sua dissertação de mestrado no Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, Valdirene mostrou ao mundo o resultado da pesquisa.
Outro fato curioso é que nosso primeiro imperador não levou para a posteridade nenhum adereço que remetesse no país. Para todos os fins, ele foi enterrado como um militar português: todos os adereços encontrados em seu caixão faziam referência exclusivamente à Portugal. O cadáver de Dom Pedro I também deflagra uma obsessão por velocidade, cavalos e acidentes. Ele apresenta fraturas em quatro costelas, decorrentes de imprevistos com carruagens nas ladeiras do Rio de Janeiro. Dona Amélia passou os últimos 137 anos segurando uma cruz de metal entre os dedos. E Dona Leopoldina, a primeira esposa do monarca, com quem teve sete filhos, não era gordinha como os quadros históricos e o imaginário nacional acreditavam, sua ossatura indica uma pessoa esguia, que ganhou a fama devido às nove gestações seguidas (dois filhos do casal tiveram que ser abortados).
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A análise dos corpos no Hospital das Clínicas, em São Paulo, teve ares cinematográficos. O transporte foi feito durante três madrugadas e, chegando ao hospital, os três eram submetidos a sessões de tomografia e ressonância magnética –os médicos até tiveram que preencher uma ficha cadastral pra cada um. Com a repercussão positiva da exumação, o plano é ousar. Os cientistas envolvidos cogitam a possibilidade de analisar o DNA do trio – um instituto americano já foi contactado e o processo deve custar cerca de 40 mil dólares e demorar até 6 meses para ser finalizado. O futuro também guarda a parte mais surreal do projeto: reconstruir os seios da face, a laringe, a faringe, a amplitude do pulmão e a caixa torácica de Dom Pedro I para reconstituir o timbre exato de sua voz.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Escolas empobrecidas: sem História nem Geografia

A escola vive uma profunda crise de legitimidade*. O mundo mudou, ficou complexo, novas demandas surgiram. Os estudantes na escola também são outros, diversos na origem e nos interesses. Os professores carecem de condições para um trabalho digno. A sociedade alterou suas expectativas referentes à escola e, assim, criou-se um complicado jogo de múltiplas contradições e, para essa complexidade, não cabem respostas e políticas simplistas.
Foto: Celso Júnior/AE
Foto: Celso Júnior/AE
Afinal, para que a escola existe? Para formar adequadamente as gerações futuras ou para preparar os estudantes para avaliações externas como Enem, Saresp, Prova Brasil, Pisa etc.?
A que se destinariam os conhecimentos? Deveriam eles compor um mosaico para criar curiosidades, desejos e perguntas nos estudantes ou só serviriam para produzir informações para uso em testes de avaliação?
Nós, pesquisadoras de educação, ficamos mais uma vez perplexas ao nos depararmos com a nova proposta curricular do ensino público do Estado de São Paulo. Para bem aprender o Português e a Matemática, sugere-se excluir os conhecimentos de História, Geografia e Ciências do 1º ao 3º ano e manter 10% dessas disciplinas no 4º e 5º anos do currículo básico. Por essa nova proposta, ficou assim decretado: doravante, por meio desse novo currículo básico, as crianças de escolas públicas estaduais só receberão, até o 3º ano, aulas de Português e Matemática! Partindo do pressuposto evidentemente errôneo de que um conhecimento atrapalha o outro, as aulas de História, Geografia e Ciências serão eliminadas do currículo desses estudantes.
Como consequência dessa política, nas escolas de tempo integral, o aluno terá aulas em um período e, no outro, oficinas temáticas das diferentes áreas do conhecimento, algumas obrigatórias e outras eletivas escolhidas de acordo com o projeto pedagógico da escola.
À primeira vista, esse currículo está “rico” e diversificado; no entanto, pelo olhar sério e comprometido, ele estará fatalmente fragmentado. Primeiramente porque verificamos que as oficinas obrigatórias também não objetivam, do mesmo modo, um trabalho com História, Ciências e Geografia; pelo contrário, voltam-se novamente para a Matemática e para o Português.
Além disso, como trabalhar a oficina optativa, por exemplo, de Saúde e Qualidade de Vida sem os fundamentos das ciências? Intriga a essa altura saber: por que oficinas e não estudo contínuo? O que se ganha com isso? Vários equívocos nos saltam aos olhos! O primeiro deles é considerar que o conhecimento de algumas áreas é acessório, ocupa espaço e ainda impede o bom aprendizado do Português e da Matemática!
As concepções de escrita e leitura, por exemplo, acabariam por ser responsabilidade exclusiva de uma única disciplina do currículo. Não seria essa uma visão muito simplista de aprendizagem, pois parece supor que o estudante não desenvolve processos de escrita e leitura também em outras disciplinas?
Outro equívoco é a suposição de que para estudantes de escola pública o mínimo basta! Para que sofisticar com lições da história, da natureza e do lugar do nosso povo? Conhecimento científico seria enfim útil para quê?
A aprendizagem não ocorre por partes. O aprendizado é todo ele integrado e sistêmico. Um bom ensino de História expande o pensamento e as referências e o estudante, assim, tem condições para perceber relações de fatos, tempo e espaço, tão necessárias à aprendizagem matemática.
A Geografia leva nossos pensamentos para viajar em outros espaços; possibilita compreender a diversidade das sociedades, conhecer e apreciar a natureza, aprender a observar e a estabelecer conexões entre lugares e culturas. Mergulhados, assim, nesses novos referenciais, os estudantes podem compreender melhor a própria realidade e encarar suas circunstâncias com pleno envolvimento. Isso certamente repercutirá na sua vida e no seu aprendizado, com consequência, por exemplo, em estudos simbólicos e gráficos.
Como deixar de aproveitar a natural curiosidade das crianças, seu espírito exploratório, suas perguntas intrigantes acerca dos fenômenos da natureza e, dessa forma, tecer as bases de um fundamental espírito científico, que por certo ajudará a compreender a Matemática e a recriar o Português?
Será que a estratégia de oficinas, ao invés do estudo contínuo, dará conta de captar tal complexidade e também de tornar possível um processo de ensino-aprendizagem que seja capaz de construir os conhecimentos de Geografia, História e Ciências que ficaram tão diminuídos no currículo básico?
De nosso ponto de vista entendemos que a questão não é separar para empobrecer. O que vale é democratizar as possibilidades de ser e de estar melhor no mundo. E para que isso aconteça precisamos da integração total de saberes e práticas.
As crianças de classe social mais favorecida possuem, antes já de chegar à escola, uma gama infindável de vivências. As crianças de classe popular, em sua maioria, chegam já à escola destituídas desse capital cultural. Possuem outras ricas e profícuas experiências que, nem sempre, são valorizadas e transformadas na escola. No entanto, o importante é trabalhar pedagogicamente com essas experiências de modo a transformá-las em vivências socialmente válidas. Pensamos que o fundamental é ampliar as oportunidades ao invés de restringi-las; para tanto, a experiência com as diferentes áreas do conhecimento é essencial.
Preocupa-nos o risco de a função da escola, para as crianças dos anos iniciais, limitar-se, a partir da reforma proposta, ao ensino das habilidades mínimas de leitura e escrita e de cálculo, retirando-se as cores e os sabores das descobertas que se fazem no contínuo do seu desenvolvimento. Preocupa-nos que esse projeto ganhe força e se concretize em outros níveis de ensino e em outros Estados. Preocupa-nos que as oficinas contribuam mais para o esvaziamento dos conteúdos do que para a construção de conhecimentos. O que será da nossa escola pública, então? Um reducionismo dos conhecimentos, um estreitamento das concepções de ensino-aprendizagem? O objetivo final será a quantificação em detrimento da qualidade? E, se atingir índices é o foco dos processos de ensino-aprendizagem, o que isso realmente significa? Qual é a verdadeira motivação da política educacional implícita nesse movimento?

As autoras Maria Amélia Santoro Franco (Unisantos), Valéria Belletati (Instituto Federal de São Paulo), Cristina Pedroso (USP/FFCLRP) são doutoras em Educação e Ligia Paula Couto (Universidade Estadual de Ponta Grossa) é doutoranda em Educação. Todas são pesquisadoras do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a Formação do Educador (GEPEFE) – FEUSP.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Escombros de fazenda no interior de SP revelam passado de admiração ao nazismo


 Os tijolos que hoje se desprendem de uma velha capelinha da fazenda Cruzeiro do Sul, em Buri (SP), servem como pistas para rastrear como um integrante de um abastado clã do Rio de Janeiro transformou sua propriedade num testemunho de admiração ao nazismo nos anos 1930.



Nessa fazenda, os blocos de barro eram feitos com uma suástica estampada.

Fazenda Nazista

José Ricardo Rosa, 55, conhecido como "Tatão" segurando um tijolo com a suástica nazista; após herdar a fazenda Cruzeiro do Sul na cidade de Campina do Monte Alegre ele encontrou por acaso tijolos com o sinal nazista usados na construção
Alguns desses tijolos viraram material para pesquisadores, assim como fotografias de bois marcados a ferro quente com o símbolo nazista, bandeiras e uma série de outros documentos encontrados na propriedade em Buri.
Sérgio Rocha Miranda cuidava da fazenda Cruzeiro do Sul. A propriedade vizinha, a Santa Albertina, ficava sob os cuidados de seu irmão, Oswaldo Rocha Miranda.
Nela, funcionava uma espécie de fazenda-orfanato para 50 meninos mantidos em um regime quase escravo.
Com idades entre 9 e 12 anos, esses garotos (somente dois deles brancos) foram entregues a Oswaldo em 1933 e 1934, após decisão judicial.

Todos haviam sido abandonados no orfanato católico Educandário Romão de Mattos Duarte, no Rio, e foram retirados de lá por Oswaldo com a promessa de terem uma vida melhor, segundo Aloysio Silva, 89, o "menino número 23" da lista de 50.

"Era uma vida diferente da prometida. Era castigo por tudo, trabalhava muito, até de fazer a mão sangrar", conta Aloysio, o número 23.
Os irmãos Maurício e Ângela Miranda, herdeiros da Santa Albertina, contestam a versão de que seus dois tios-avôs fossem nazistas que escravizaram os meninos.
As fazendas, que se espalhavam por área que hoje alcança três municípios, chegaram à família via Luis Rocha Miranda, simpatizante do movimento fascista Ação Integralista Brasileira.
Pai de Sérgio e Oswaldo, Luis comprou as propriedades do brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar (1794-1857), fundador da PM de São Paulo.
As primeiras marcas da simpatia de Sérgio pelo nazismo foram descobertas em 1997 pelo tropeiro José Ricardo Rosa Maciel, 55, o Tatão. Dono de espessa barba branca, ele narra a descoberta.

"Teve uma briga da porcada, que derrubou a parede do chiqueiro. Quando vi o estrago, achei os tijolos com a marca nazista. Passaram anos me chamando de louco, mas agora tá tudo comprovado pelos estudos do doutor Sidney."

Tatão se refere ao historiador Sidney Aguilar Filho, 45. Em 1998, ele dava aula para a enteada de Tatão quando ela revelou que, na fazenda onde vivia, havia tijolos com aquele "símbolo alemão" das aulas de história.
Sidney investigou por mais de uma década e, em 2011, apresentou sua tese de doutorado na Unicamp sobre a exploração do trabalho e a violência à infância no país no período de 1930 a 1945.
"Por muitos anos, aqueles meninos foram submetidos a um regime de trabalho como se fossem adultos, sem remuneração, sem liberdade de ir e vir e estudando pouco. Mas aquilo era aceito pela sociedade", diz ele.

ANDRÉ CARAMANTE
ENVIADO ESPECIAL AO INTERIOR DE SP


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Veja como era o cotidiano do Brasil durante a Segunda Guerra Mundial


No caminho para a Europa, havia Natal. Nunca antes a cidade tinha recebido tantos turistas. Rapazes brancos que em poucos dias ficavam cor de laranja sob o sol, o que não espantava as moças da cidade. Elas cercavam os GIs para conhecer as novidades, inéditas na história do país. Whisky, Coca-Cola, Lucky Strike, foxtrot e bombardeiros de 16 toneladas.
Ilustração: Felipe Massafera

Cotovelo geográfico

Hoje, quem anda pela orla em Natal chega a Miami. A praia de Miami, assim batizada graças a quem a frequentava 70 anos atrás. No auge da Segunda Guerra, tomar sol em Miami, Rio Grande do Norte, era um dos passatempos dos 10 mil soldados americanos que, entre 1942 e 1945, operavam as bases militares mais importantes dos aliados no Hemisfério Sul - o Campo de Parnamirim e a Base Naval de Hidroaviões.

Espécie de cotovelo entre a América e a África, o Nordeste brasileiro era considerado pelos americanos um dos pontos mais estratégicos do mundo. Os aviões militares, que partiam da Miami original, nos EUA, faziam escala em Porto Rico, Trinidad e Belém - para depois partirem rumo a Senegal, Togo e Libéria e daí à Europa, levando carga ou os próprios bombardeiros, como as fortalezas voadoras B-17 e B-24. Parnamirim virou o aeroporto mais congestionado do mundo, com até 800 pousos e decolagens por dia. "Antes pacata e tranquila, a vida noturna de Natal alterava-se profundamente: era agora agitada e trepidante; bares e boates surgiam da noite para o dia", escreve o jornalista Murilo Melo Filho em seu livro de memórias, Testemunho Político. A americanização logo chegou aos trajes. Os homens abandonaram os ternos e as calças de risca-de-giz e passaram a vestir roupas cáqui de inspiração militar. As calças de brim azul, usadas nas horas vagas por recrutas americanos, chegaram ao Brasil via Natal - embora só fossem se espalhar pelo país na década de 50. As moças - que antes só passeavam na companhia de pais e irmãos, vestidas com saias rodadas - agora andavam sozinhas, de calças compridas, mascando chicletes, o sinal inconfundível da modernidade.

Além dos soldados, Natal recebeu estrelas do showbiz, enviadas pelo governo dos EUA para levantar o moral das tropas. Humphrey Bogart veio animar a estreia de Casablanca no teatro da base, em 1942. A orquestra de Glenn Miller tocou no Cine Rex. Nos prédios das bases militares, sucediam-se festas onde os combatentes americanos se misturavam aos jovens - e, principalmente, às jovens - natalenses.

Além de cortejar as moças de família, os americanos eram frequentadores de prostíbulos como o Wonder Bar, a Casa da Maria Boa, a Pensão Estela e o Bar Ideal. (Para controlar as doenças venéreas, os médicos do exército passaram a examinar as moças da zona de meretrício e as garotas saudáveis ganharam atestados chamados love cards.) Em Natal, mais do que em qualquer outro lugar das Américas, a política da boa vizinhança era um tremendo sucesso.

A Política de Boa Vizinhança do presidente americano Franklin Roosevelt era uma doutrina para toda a América Latina, visando combater o antiamericanismo e as simpatias pelo Eixo por meio de trocas culturais patrocinadas pelo Estado. Quando o Brasil entrou na guerra do lado aliado, em 22 de agosto de 1942, assumiu mais que um compromisso militar. Os americanos deixavam de ser figuras de cinema para se tornarem presenças físicas. Os brasileiros, antes só exóticos, viraram exóticas figuras de cinema.

-O que é isso, senhora Miranda?

-Um reco-reco.

-Reco... reco? - a voz poderosa vinha em fortíssimo sotaque americano.

-Sim. E isto é um pandeiro.

-Pandeiro?

-Sim, um pandeiro. Algo errado, mister Welles?

-Nada. É que às vezes fico meio confuso.


Era 15 de novembro de 1942 e o diálogo ocorria em um estúdio no Rio de Janeiro, transmitido diretamente à radio CBS dos EUA. Ao redor do microfone estavam Orson Welles - a voz mais famosa do país, graças à transmissão de A Guerra dos Mundos, em 1938, e que havia acabado de estrear no cinema com Cidadão Kane - e Carmem Miranda, que na época já era uma estrela de Hollywood. Ela tinha migrado aos EUA meses antes da guerra - quando o conflito começou, havia estourado na Broadway com o musical Streets of Paris, cantando Mamãe Eu Quero. Lá, ganhara o apelido de brazilian bombshell. Carmen era a encarnação da política de boa vizinhança: em 1940, se apresentou na Casa Branca e no mesmo ano foi eleita a terceira personalidade mais popular de Nova York.

Nas dezenas de filmes dos quais participou em Hollywood, Carmem se tornaria um estereótipo não só do Brasil mas também de toda a América Latina. Já Welles havia sido enviado para cá com a incumbência de gravar um documentário sobre o país - encomenda do Office of Interamerican Affairs. Welles virou figura folclórica nas noites cariocas: acompanhado de tipos como Grande Otelo, tomava proverbiais bebedeiras de cachaça, colecionava amantes e discorria sobre as origens comuns do jazz e do samba para extasiados convivas em bares e boates.

O Office havia enviado ao Brasil outro personagem ilustre: Walt Disney. O Rio de Janeiro foi a principal parada em uma viagem pela América Latina, no início de 1941 - uma espécie de pesquisa de campo para um filme de propaganda da amizade continental. Disney instalou seu QG no Copacabana Palace e cercou-se de artistas locais para sentir o clima. Com a ajuda de cartunistas brasileiros como J. Carlos e Luiz Sá, criou o maior sucesso da Disney no Brasil: Zé Carioca. Aliás, não criou: encontrou. Na comitiva brasileira estava o músico José do Patrocínio Oliveira, paulista de Jundiaí. Como membro do Bando da Lua, a banda de Carmem Miranda, viveu nos EUA, onde aprendeu inglês. Foi assim, sendo ele mesmo, que interpretou o papagaio Zé Carioca na animação Alô, Amigos, de 1942. Pois é, Zé Carioca era paulista. O personagem ainda é publicado no Brasil, enquanto ninguém se lembra mais dele no exterior.

A missão de Welles não foi tão bem-sucedida: em vez de gravar loas ao governo Vargas - conforme a encomenda -, ele registrou a vida nos cortiços cariocas e de tecelões e pescadores pobres no Nordeste. Os rolos acabaram confiscados. As imagens do documentário ainda existem, mas nunca foram montadas.O filme se chamaria: It's All True (É tudo verdade).

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Ex-policial torturador deu aulas por 24 anos com identidade falsa


 Por 24 anos, Cleber de Souza Rocha deu aulas de geografia em escolas públicas da zona norte na capital paulista. Apesar das faltas e de relatos de alunos de que costumava ir às aulas embriagado, conseguiu chegar ao posto de diretor de escola municipal.
Durante o período, ninguém havia suspeitado de que aquele professor, motivo de piada entre alunos, era, na verdade, um ex-investigador de polícia condenado por homicídio e tortura.


Julgado em 1982 por um crime cometido três anos antes, Cleber decidiu fugir. E adotou o nome, documentos e o diploma do irmão mais novo, sem o conhecimento dele.
Foi aprovado em concursos para lecionar geografia nas escolas da prefeitura e do Estado. Na rede municipal, passou no concurso para diretor.
Tirou ainda carteira de motorista e contraiu empréstimos como se fosse o irmão, com quem brigou ainda jovem.
A farsa durou de 1984 a 2009, ano que ele morreu. Apenas meses antes a prefeitura e o Estado descobriram que haviam sido enganados.
E só no final do mês passado o Conselho Estadual de Educação concluiu o caso --os alunos de Cleber não precisarão refazer as aulas.
O irmão caçula ainda tenta se livrar na Justiça de empréstimos bancários que estão em seu nome, mas que foram feitos pelo irmão. 


HISTÓRICO
Cleber deu início à farsa em 1979, quando era investigador de polícia na região de Perus (zona norte). Um motorista foi detido sob a suspeita de integrar uma quadrilha que atuava na região. Não havia provas claras de que ele de fato era um criminoso.
Após seis dias, o suspeito foi achado morto na delegacia. Segundo o processo, foi torturado por várias vezes e de diversas formas.
Cleber foi apontado como um dos principais autores das torturas. Eles utilizaram, entre outros instrumentos, um pau-de-arara.
Na época, o ex-policial negou o crime. Afirmou que nem teve contato com o preso.
Mas, em 1982, a Justiça concordou com os argumentos do então promotor Luiz Antonio Fleury Filho --eleito governador de São Paulo oito anos depois: Cleber foi condenado a cinco anos e oito meses de prisão e ainda perdeu o cargo.
Com a prisão decretada, Cleber não se entregou. Dois anos depois, ingressou na rede municipal como professor.
O advogado do irmão caçula, Francisco Deus, diz não saber onde Cleber conseguiu os papéis, que também foram usados para a entrada na rede estadual, um ano depois. O irmão pede para que seu nome não seja divulgado.
A falsificação não causou suspeitas, segundo a Secretaria Estadual de Educação, porque Cleber havia se formado em geografia e em pedagogia.

DAVA NOTAS BOAS
O falso professor lecionou em ao menos seis escolas públicas, todas na zona norte.
Entre 2004 e 2008, sofreu quatro suspensões ou repreensões, por não cumprir ordens superiores ou por excesso de faltas ao trabalho.
Ex-alunos da escola estadual Joaquim Luis de Brito, em Itaberaba (zona norte da capital), relatam em redes sociais na internet que Cleber constantemente chegava alcoolizado e dispensava os estudantes sem motivos.
"Ele nunca passava nada [de matéria] e sempre dava notas boas", brinca uma ex-aluna. Muitos disseram que, algumas vezes, era bruto.
Foi justamente a truculência que fez a fraude ser descoberta. Em 2008, ele discutiu com um vizinho. Na delegacia, se identificou ora com o nome verdadeiro, ora com o do irmão.
Desconfiado, o delegado resolveu analisar as digitais. Era o fim da farsa.
Chamada à delegacia, a diretora da escola Joaquim Brito afirmou que nunca havia suspeitado de nada.
Antes do fim dos processos nas redes estadual e municipal, Cleber morreu aos 54 anos, em decorrência de insuficiência respiratória, hepática e renal aguda.
Pouco antes, o advogado do irmão encontrou Cleber. "Ele disse: 'O que vocês queriam? Que eu roubasse?' Isso chamou a atenção. Ele fez toda a confusão para ser professor. Poderia ter virado traficante. A situação fez o irmão ficar um pouco menos chateado."

FÁBIO TAKAHASHI
DE SÃO PAULO

Fonte: Folha de São Paulo [http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1226592-ex-policial-torturador-deu-aulas-por-24-anos-com-identidade-falsa.shtml ]

Mary Leakey, arqueóloga, é homenageada no 100º aniversário em doodle do Google


Pesquisadora descobriu fóssil de primata extinto que poderia ser ancestral dos humanos

Mary Leakey, arqueóloga britânica, é homenageada no seu 100º aniversário pelo doodle (logo) do Google nesta quarta-feira.  Foi ela quem descobriu o primeiro fóssil de um primata extindo que é tido como ancestral dos humanos. A descoberta do proconsul africanus foi feita em 1948.

Mary Leakey Foto: National Institutes of Health / ReproduçãoLeakey nasceu em 6 de fevereiro de 1913, em Londres, e morreu em 9 de dezembro de 1996 no Quênia. As primeiras pesquisas e descobertas da arqueóloga foram publicadas pelo seu marido, Luis S. B. Leakey.

Mary Leakey
Foto: Google.com / Reprodução

Segundo a Enciclopédia Britânica, a experiência de Leakey com a arqueologia começou quando ela ainda era criança. Ela ajudou nas escavações de um sítio arqueológico quando menina e começou a ganhar habilidade como desenhista dos achados encontrados pela equipe.

Mary Leakey  publicou pelo menos quatro livros, entre 1950 e 1983, revelando suas descobertas.

Os doodles do Google
O Google costuma comemorar datas importantes para a humanidade, como aniversários de invenções e personalidades ligadas à cultura e à política, por exemplo, com customizações do logo na página inicial do site de buscas. O primeiro doodle surgiu em 1998, quando os fundadores do Google criaram um logotipo especial para informar aos usuários do site que eles estavam participando do Burning Man, um festival de contracultura realizado anualmente nos Estados Unidos. O sucesso foi tão grande que hoje a companhia tem uma equipe de designers voltada especialmente para a criação dos logotipos especiais. Já foram criados mais de 300 doodles nos Estados Unidos e mais de 700 para o resto do mundo.

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