Ela inaugura o que se convencionou chamar direito humanitário, em matéria internacional; isto é, o conjunto das leis e costumes da guerra, visando minorar o sofrimento de soldados doentes e feridos, bem como de populações civis atingidas por um conflito bélico. É a primeira introdução dos direitos humanos na esfera internacional. O direito da guerra e da paz, cuja sistematização foi feita originalmente por Hugo Grócio em sua obra seminal no início do século XVII (Ius Belli ac Pacis), passou, desde então, a bipartir-se em direito preventivo da guerra (ius ad bellum) e direito da situação ou estado de guerra (ius in bello), destinado a regular as ações das potências combatentes.
A evolução posterior, no entanto, levou ao reconhecimento da injuricidade objetiva da guerra como solução de conflitos internacional, quaisquer que sejam as razões de seu desencadear. O direito contemporâneo, a partir da Carta de São Francisco, instituidora das Nações Unidas, restringiu sobremaneira o conceito de guerra justa, elaborado pelos doutores da Igreja na Idade Média.
Com base nisto, tem-se insistido ultimamente na tese de que o direito do estado de guerra (ius in bello) já não poderia existir, por ser uma contradição nos termos: se a guerra constitui em si mesma um ilícito e, mais do que isso, um crime internacional, não faz sentido regular juridicamente as operações bélicas – o Direito não pode organizar a prática de um crime.
Tal argumento, impressionante à primeira vista pelo seu aparente rigor lógico, não é contudo aceitável. Se a guerra, no estado presente do direito internacional, constitui em si mesma um crime, nada impede que se reconheça a prática, por qualquer das partes beligerantes, de outros ilícitos durante o desenrolar do conflito. A violação dos princípios e normas do direito humanitário, durante uma conflagração armada, pode por conseguintes representar, ele também, em crime de guerra. No julgamento de 27 de junho de 1986 no caso Nicarágua v. Estados Unidos, de resto, a Corte Internacional de Justiça reconheceu plena vigência dos “princípios gerais de base do direito humanitário”.
A Convenção assinada em Genebra em 22 de agosto de 1864, unicamente por potências européias, e destinada a “melhorar a sorte dos militares nos exércitos em campanha”, originou-se dos esforços de uma comissão reunida em torno do suíço Henry Dunant. Em livro publicado em 1862 e que teve ampla repercussão (Un Souvenir de Solférino), ele relatou como organizara, durante a batalha de Solferino de junho de 1859 entre os exércitos austríacos e franco-piemonteses, os serviços de pronto-socorro para os soldados feridos de ambos os lados.
A comissão genebrina, que teve na origem da convenção de 1864 foi revista, a fim de se estenderem seus princípios aos conflitos marítimos (Convenção de Haia de 1907) e aos prisioneiros de guerra (Convenção de Genebra de 1929). Em 1925, outra Convenção, igualmente assinada em Genebra, proibiu a utilização , durante a guerra, de gases asfixiantes ou tóxicos, bem como de armas bacteriológicas. As convenções sobre soldados feridos e prisioneiros de guerra foram revistas e consolidadas em três convenções celebradas em Genebra em 1949, sob os auspícios da Comissão Internacional da Cruz Vermelha. Na mesma ocasião, foi celebrada uma Quarta convenção, tendo por objetivo a proteção da população civil em caso de guerra.
O Texto
Sua Majestade o Rei dos Belgas, Sua Alteza Real o grão-duque de Baden, Sua Majestade o Rei da Dinamarca, Sua Majestade a Rainha da Espanha, Sua Majestade o Imperador dos Franceses, Sua Alteza Real o grão-duque de Hesse, Sua Majestade o Rei da Itália, Sua Majestade o Rei dos Países Baixos, Sua Majestade o Rei de Portugal e Algarve, Sua Majestade o Rei da Prússia, a Confederação Suíça, Sua Majestade o Rei de Wurtermberg:
Animados, por igual, do desejo de suavizar, tanto quanto deles dependa, os males irreparáveis da guerra, de suprimir os rigores inúteis e melhorar a sorte dos militares feridos nos campos de batalha, resolveram concluir uma Convenção com esse objetivo e nomearam seus Plenipotenciários, a saber:
(...)
os quais, após terem apresentado seus poderes, encontrados em boa e devida forma, convencionaram os artigos seguintes:
artigo 1º As ambulâncias e os hospitais militares serão reconhecidos como neutros e como tal protegidos e respeitados pelos beligerantes, durante todo tempo em que neles houver doentes e feridos.
A neutralidade cessará, se essas ambulâncias ou hospitais forem guardados por uma força militar.
Artigo 2º O pessoal dos hospitais e das ambulâncias, nele incluídos a intendência, os serviços de saúde, de administração, de transporte de feridos, assim como os capelães, participarão do benefício da neutralidade, enquanto estiverem em atividade e subsistirem feridos a recolher ou a recorrer.
Artigo 3º As pessoas designadas no artigo procedente poderão, mesmo após a ocupação pelo inimigo, continuar a exercer suas funções no hospital ou ambulância em que servirem, ou retirar-se para retomar seus postos na corporação a que pertencem,
Nesses circunstâncias, quando tais pessoas cessarem suas funções, elas serão entregues aos postos avançados do inimigo, sob a responsabilidade do exército de ocupação.
Artigo 4º Tendo em vista que o material dos hospitais militares permanece submetido às leis de guerra, as pessoas em serviço nesses hospitais não poderão, ao se retirarem, levar consigo os objetos que constituem propriedade particular dos hospitais.
Nas mesmas circunstâncias, ao revés, a ambulância conservará seu material.
Artigo 5º Os habitantes do país, os quais socorrem os feridos, serão respeitados e permanecerão livres.
Os generais das Potências beligerantes terão por missão prevenir os habitantes do apelo assim feito ao seu sentimento de humanidade e da neutralidade que lhe é conseqüente. Todo ferido, recolhido e tratado numa casa particular, conferirá salvaguarda a esta última. O habitante que recolher feridos em sua casa será dispensado de elogiar as tropas, assim como de pagar uma parte dos tributos de guerra que lhe seriam impostos.
Artigo 6º Os militares feridos ou doentes serão recolhidos e tratados, qualquer que seja a nação à qual pertençam.
Os comandantes em chefe terão a faculdade de entregar imediatamente, aos postos avançados do inimigo, os militares feridos em combate, quando as circunstâncias o permitirem e desde `haja consentimento de ambas as partes.
Serão repatriados em seus países aqueles que, uma vez curados, forem reconhecidos como incapazes de servir.
Os outros poderão igualmente ser repatriados, sob a condição de não retomarem armas durante toda a guerra.
As forças de retirada, como o pessoal que as dirige, ficarão garantidas por uma neutralidade absoluta.
Artigo 7º Uma bandeira distinta e uniforme será adotada pelos hospitais e ambulâncias, bem como durante as retiradas. Ela deverá ser, em qualquer circunstância, acompanhada da bandeira nacional.
Uma braçadeira será igualmente admitida para o pessoal neutro; mas a sua distribuição ficará a cargo da autoridade militar.
A bandeira e a braçadeira terão uma cruz vermelha sobre fundo branco
Fonte: http://www.dhnet.org.br/
O problema é que muitas vezes, esses Tratados e Convenções não são respeitados por vários países. Cito aqui o exemplo atual de Israel na Palestina, e dos EUA no Iraque e no Afeganistão.
ResponderExcluirAh... também gostaria de agradecer a sua visita ao meu blog. Valeu mesmo!
Um grande abraço, :-)